Revelado!!! O molho secreto da Agilidade

A agilidade tem um molho secreto e ele é composto por três ingredientes: ciclos curtos, melhoria contínua e foco em valor. Eles são a base dos Métodos Ágeis. Inclusive, para saber se um framework, prática, método é realmente ágil, basta verificar se ele passa nessa peneira: estabelece ciclos curtos para entrega, avaliação, verificação e análise; se propõe a fazer melhoria contínua em diferentes aspectos do trabalho; tem foco em resultado tangível, pragmático e impactante. 

Diagrama de Venn com três círculos sobrepostos representando "Melhoria Contínua", "Ciclos Curtos" e "Foco em Valor". No centro da interseção, está a palavra "Agilidade". As sobreposições parciais indicam problemas como "Falta de Feedback", "Resultados apenas no curto prazo" e "Sem direção", simbolizando a ausência de um dos pilares.
Diagrama de Venn ilustrando os três ingredientes essenciais da agilidade: melhoria contínua, ciclos curtos e foco em valor. A interseção total entre os três define a verdadeira agilidade. As interseções parciais revelam riscos comuns quando um deles está ausente.

Infelizmente existem muitas práticas que os times utilizam com o selo de “ágil” porém estão longe disso. Por isso, neste texto, detalho cada um desses ingredientes e espero te ajudar a tornar o seu time mais e mais ágil de verdade.

Ingrediente 1 da Agilidade: Ciclos curtos

Hoje em dia esse é um conceito bem estabelecido, porém, quando surgiu, foi uma grande quebra de paradigma. Os ciclos curtos evitam que caiamos em problemas comuns da construção de projetos.

Parálise pela análise

Ficar meses e meses analisando o que deve ser feito, sem nunca começar a construir nada. A análise gigante é enfadonha e não gera valor para ninguém. Uma pequena entrega que promova alguns feedbacks é melhor do que ficar um tempão dentro de uma sala especulando o que poderá ser feito. Afinal, não conseguimos prever como as pessoas usam nosso produto até elas começarem a utilizá-lo.

Vou dar um exemplo, há muitos anos atrás, desenvolvemos um sistema de agendamento focado na população do estado do Rio de Janeiro. A pessoa digitava seu endereço e apresentávamos o posto de atendimento mais próximo a ela. Recebemos algumas reclamações de que elas não achavam os endereços, mesmo consultando a base dos Correios. Como disponibilizamos o serviço de agendamento em poucas semanas, percebemos rapidamente que:

  1. CEP não é algo que o grande público conhece.
  2. Em comunidades é muito comum, temos ruas homônimas com nome curto: Rua A, Rua Dois. De vez em quando as pessoas conheciam o logradouro por alguma característica. Por exemplo: Rua A de Baixo e Rua A do Alto.
  3. A palavra “município” não é tão trivial como imaginávamos

Com essas informações, na semana seguinte resolvemos esses problemas e as reclamações sobre não encontrar o endereço caíram 85%.

Maratona é uma corrida muito longa

Outro problema que aparece quando não temos ciclos curtos é que todos começam o projeto encarando como se fosse uma grande e cansativa maratona. Por isso, há uma frase que parece meio piegas, mas é válida: “Toda corrida começa com o primeiro passo”. Se pensarmos que temos que correr 42 km, isso pode dar uma desanimada. Já se pensarmos que temos que correr 4 km, e quando o alcançarmos teremos mais 4 km e assim por diante, isso facilita muito. Inclusive a corrigir a estratégia ao longo da corrida. 

Síndrome do Estudante Relapso

O estudante relapso é aquele que deixa para estudar um dia antes da prova. A mesma coisa em nossos times, resolvemos duzentas pendências, manutenções e quando o prazo do projeto que deveríamos estar trabalhando fica apertado, começamos a correr contra o relógio na tentativa de recuperar o irrecuperável tempo perdido. Normalmente é quando surgem as “salas de guerra” e a liberação de horas extras. 

Lei de Parkinson 

Cyril Northcote Parkinson afirmou:

 “o trabalho se expande de modo a preencher o tempo disponível para a sua realização.” 

Digamos que seu chefe muito gente boa deu para o seu time seis meses para concluir um projeto. Vocês analisaram e acham que três meses seriam suficientes. Como vocês acham que estarão quando faltar uma semana para o sexto mês? Se você tem experiência com projetos, sabe que estarão em um corre-corre frenético tentando desesperadamente juntar as coisas para fazer funcionar. 

Por que isso acontece? Já que tínhamos três meses de folga, e somos muito responsáveis, cada um fez o seu melhor: o banco de dados é o melhor banco de dados do mundo, a arquitetura é desenhada para dar suporte ao universo, a segurança é mais forte do que um porta-aviões, o software seguiu 100% dos padrões de desenvolvimento e assim, com todos usando o estado da arte, o trabalho de expandiu e ocupou todo o tempo disponível.

Os ciclos curtos não só evitam esse problema, como reduzem o risco de entregarmos para nossos clientes algo irrelevante e comercialmente inviável.

Ingrediente 2 da Agilidade: Melhoria Contínua 

Esse foi o grande clique de todos os métodos ágeis. Melhoria contínua é tão importante que podemos afirmar que um time que não faz melhoria contínua, não pratica Agilidade. Ela envolve o aprimoramento do produto / serviço, dos processos de trabalho, ferramentas, do time e dos indivíduos que compõem o time. 

Uma característica importante da melhoria continua é que se baseia  no método científico e sempre gera evidências. Por isso, ela requer que você crie uma hipótese, prepare e execute um experimento, colete o resultado e avalie se a hipótese se confirmou. Não há melhoria contínua se tudo está baseado em sentimento.

Infográfico em português representando 1 dos itens essenciais da agilidade: o ciclo de Melhoria Contínua com quatro etapas: Hipótese, Experimento (com uma cientista segurando um frasco), Resultados Concretos (simbolizados por uma parede de tijolos) e Análise (com ícone de lupa e exclamação). As etapas estão dispostas em círculo com setas indicando o fluxo contínuo.
Melhoria Contínua é baseada no método científico

Parece complicado, mas não é. Vou dar um exemplo. Há algum tempo atrás nossos times de desenvolvimento de software passavam por um problema crônico. Os usuários, clientes e patrocinadores tinham acesso livre e irrestrito à nossa sala. Toda hora chegava alguém direito no desenvolvedor, interrompia o trabalho dele e lhe dava uma “demanda” urgente. Isso era muito chato por: a) interromper o raciocínio do desenvolvedor, b) mudar o foco do seu trabalho: e c) capturar o desenvolvedor para fazer algo não era importante para a organização. 

Foi então em uma reunião de retrospectiva que a Sonia Moreira deu a ideia de utilizarmos uma plaquinha vermelha na parte de trás do monitor (1ª coisa que a pessoa externa veria) com a frase: “Estou ocupado, procure alguém com a placa verde”.

Placas facilitadoras da agilidade: Duas placas sinalizadoras. À esquerda, uma placa com topo vermelho e texto: "DESENVOLVENDO TAREFA URGENTE. FAVOR NÃO INTERROMPER! Procure alguém com a placa verde." À direita, uma placa com topo verde e texto: "EM QUE POSSO AJUDAR?". A imagem representa um sistema visual de gestão de interrupções em equipes de desenvolvimento.
Placas indicativas de disponibilidade no ambiente de trabalho. A placa vermelha sinaliza foco total e proíbe interrupções; a verde indica que a pessoa está disponível para ajudar. Uma solução simples para reduzir distrações e melhorar a produtividade em equipes ágeis.

Isso causava um desconforto no visitante. O que parecia algo ruim, afinal ninguém gosta de gerar desconforto, mas teve resultado muito positivo. Com o passar do tempo, o desconforto fez com que as pessoas parassem de ir à sala. O que melhorou muito o trabalho de todos, inclusive daqueles “visitantes”.

Ingrediente 3 da Agilidade: Foco em Valor

Por fim, o último competente do molho secreto da Agilidade é foco em valor. Aqui não podemos ser piegas e achar que qualquer coisa é valor. Já vi muita coisa estranha recebendo esse título. 

Em uma determinada empresa, o objetivo de uma unidade de TI era trocar 100% dos computadores desktop de seus colaboradores. Eles fizeram e ficaram muito felizes. Parece que não tem nada demais, afinal é algo comum. Entretanto, era maio de 2020, pico da pandemia de COVID-19 e 3º mês de lockdown, não havia ninguém para utilizar os desktops e nem previsão para retornarem. De fato, os computadores só foram utilizados quase 2 anos depois. Já defasados e sem garantia do fabricante.

No artigo “O que é valor?”, detalhamos o quê pode ser considerado como tal. Uma grande dica que costumo a utilizar é definir o valor antes de começar o projeto ou iniciativa. Por exemplo: A iniciativa X aumentará a receita. O projeto Y melhorará a satisfação do nosso cliente. Se deixar para especificar o valor depois de começar, podemos entrar no modo defesa: “Já que não impactei nada relevante, deixa eu procurar qualquer indicador para justificar que eu entreguei ‘valor’”. 

Claro! Aqui está a descrição em texto corrido:--- O infográfico mostra o ciclo da Melhoria Contínua, com quatro etapas principais organizadas em um formato circular e conectadas por setas que indicam um fluxo contínuo. A primeira etapa, “Hipótese”, é representada por um círculo com um ponto de interrogação no centro, simbolizando o início do processo com a formulação de uma ideia a ser testada. Em seguida, “Experimento” traz a ilustração de uma mulher cientista segurando um frasco de laboratório, representando a fase de execução da hipótese. A etapa “Resultados Concretos” vem a seguir, ilustrada por uma parede de tijolos azuis, indicando que os resultados obtidos são reais, visíveis e mensuráveis. Por fim, “Análise” é representada por uma lupa com um ponto de exclamação, simbolizando a avaliação dos dados obtidos para validar ou não a hipótese inicial. O título “Melhoria Contínua” aparece centralizado no topo, em fonte azul escura e destaque. O design é minimalista, com fundo claro e uso de cores sóbrias, reforçando clareza, objetividade e foco no conteúdo. --- Se precisar da versão adaptada para leitores de tela ou descrições longas em acessibilidade, posso ajustar também.
Farol que direciona sua luz para elementos simbólicos de valor: retorno financeiro, satisfação do usuário, qualidade percebida e desenvolvimento por meio do aprendizado.

Conclusão

Se quisermos mesmo viver a Agilidade — e não apenas “fazer agile” — precisamos encarar de frente esses três pontos essenciais: ciclos curtos, melhoria contínua e foco em valor. Eles não são apenas boas práticas; são o norte verdadeiro para qualquer time que queira entregar resultado, aprender e gerar impacto real. O resto? É só barulho. Reuniões de stand-up, quadros coloridos e jargões em inglês. Portanto, da próxima vez que alguém disser que está sendo ágil, pergunte:

– “Qual valor você entregou esta semana?”,

– “O que você melhorou desde a última entrega?”,

– “Quando foi a última vez que você aprendeu algo?”

Agilidade é fazer melhor, mais cedo, com resultado. O resto é só desperdício fantasiado de processo.

Avelino segurando um microfone e uma camiseta preta escrita Agile. Ele é pardo, barba e cabelos grisalhos.

Sobre o autor(a)

Trainer na K21

Avelino Ferreira é formado e mestre em Ciência da Computação. Teve uma longa trajetória na TI, começando como programador e chegando a gestor de diversos times de criação de produtos digitais. Conheceu e começou a adotar as melhores prática de de Métodos Ágeis em 2008. Desde então, se dedica a auxiliar outras empresas na construção da cultura ágil. Atualmente, é Consultor e Trainer na K21

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